Às vezes tenho muita dificuldade em perceber onde minha mãe está sendo "intrusa" demais, talvez por criação, talvez porque dependo dela, talvez por culpa, sei lá. Mas veja bem, aconteceu dela praticamente arrastar meu irmão para uma cirurgia estética (no nariz, pois era grande). Ela ficava falando do nariz do guri, até que ele realmente passou a se incomodar com o tamanho e começou a aceitar a ideia de cirurgia. Aí ELA decidiu a data, pois ele não queria naquele período, mas ela insistiu... E agora diz "ainda bem que INSISTI, olha que bonito ficou!", e eu acho isso meio ridículo, porque parece que ela mesma criou essa neurose pra ele. Eu sei que nossos pais querem o nosso bem (num geral, rs) e por ele estar triste pelo fim de um relacionamento ela achou que isso iria ajudar. Mas, poxa, por que não pensar num meio mais light de fazer isso? Sei lá, terapia, qualquer coisa. Bom, o que te pergunto é: estou exagerando? Eles sabem o que é melhor? E por fim, como melhorar um pouco essa relação de domínio que nossos pais às vezes têm sobre nossas mentes, de uma maneira boa, até porque sou dependente deles?
Anon.
Você provavelmente já sabe as respostas pra algumas dessas perguntas, o que eu tenho pra dizer só vai confirmar a sua intuição. Os pais, no geral, têm as melhores intenções do mundo, mas eles não ganham magicamente o conhecimento pra fazerem sempre o que é melhor pelos filhos assim que se tornam pais. Eles são tão humanos quanto qualquer outra pessoa, quanto você ou eu. Eles aprendem pelo caminho. E eles também erram.
Sobre a intrusão da sua mãe, eu não tenho como saber exatamente o que está acontecendo. Pode ser várias coisas, por exemplo: quando os filhos crescem, eles se ressentem se continuam sendo tratados como crianças, então as relações da família passam por um período de adaptação. Isso é normal.
Por outro lado, esse episódio da cirurgia plástica do seu irmão chama bastante a atenção.
A insistência na cirurgia pode passar a mensagem errada: se o seu irmão não via problemas na própria aparência, a insistência tira o valor do julgamento dele, sabota a sua independência e o seu amadurecimento. Sugere que ele pode sempre colocar a culpa de coisas como fim de um namoro em razões superficiais, ou fora do seu controle, ou que a culpa vai ser sempre dele, ao invés de considerar razões mais sutis e importantes, como a qualidade do relacionamento, as expectativas emocionais de cada um, ou o próprio fato de que às vezes namoros acabam, e é assim que tem que ser.
O que você precisa fazer é observar o que acontece quando você e o seu irmão rejeitam a interferência dela nas suas vidas. Ela aceita sem problemas? Ela tenta argumentar? Ela não desiste até conseguir o que quer? Ela perde o controle e briga, faz ameaças, chantagem emocional?
E outras coisas importantes: ela respeita a privacidade de vocês, ou precisa saber de tudo, estar envolvida com tudo, colocar o dedo em tudo? Insiste em direcionar as suas amizades, namoros, como se escolhesse as pessoas por você? Insiste em direcionar as suas escolhas, como se o seu próprio julgamento não importasse? É possível discordar dela, ela admite que erra, que é humana e imperfeita, sabe pedir desculpas? Ela dá valor pra opinião e para os gostos de vocês, ou só tenta impor os dela?
Dependendo do que você observar aí, vai descobrir se está lidando com as rusgas, os atritos e as transformações normais de qualquer família, ou com problemas de relacionamento mais sérios, ou até, no extremo, com problemas psicológicos graves. Porque, veja bem: pais também têm depressão, transtorno bipolar, transtorno de personalidade, e isso obviamente afeta seus filhos.
O abuso emocional praticado por pais e mães com doenças psicológicas não diagnosticadas ou tratadas tem efeito tão ou até mais grave que o abuso físico e sexual, mas isso ainda é pouco reconhecido e comentado, principalmente no Brasil. Se o seu Inglês estiver em dia, leia este depoimento aqui, e outros: What is it like to be raised by a narcissist?
Quanto ao que fazer... o mais importante aqui é que você e o seu irmão aprendam a viver bem a própria vida, e adquiram independência aos poucos. Pra isso, é necessário começarem a tomar as suas próprias decisões, cometerem erros e aprenderem com eles. É necessário que aprendam a amar e respeitar a si próprios.
Então, se você acha mesmo que ela interfere demais, seja franca: diga que entende a preocupação, mas que precisa de espaço. Se as relações na sua família forem fundamentalmente saudáveis, vocês vão chegar a um acordo.
Se a comunicação com ela for, digamos, complicada, talvez possa mandar o recado pelo seu pai, ou algum outro parente próximo? Mas note que é sempre bom aprender a ter "conversas difíceis" com as pessoas, quanto antes, melhor.
Se a situação for mais grave, e envolver brigas, chantagem e abuso emocional, muito provavelmente a melhor coisa que você pode fazer é procurar a ajuda de um psicólogo. Tanto pra ter acesso a uma perspectiva independente, depois de ter lidado por tanto tempo com essa situação difícil e não exatamente saudável, quanto porque, como mencionei antes, ela pode ter consequências bastante sérias.
Boa sorte.
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