Monday, April 13, 2015

Uma conversa de 20 minutos pode fazer a diferença no apoio ao casamento gay.

CORREÇÃO: Um mês e meio após eu publicar este texto, foi descoberta fraude no estudo em questão, o que, dada a sua repercussão, rendeu um dos maiores escândalos das ciências sociais na história recente. No entanto, isso não significa que os resultados do estudo foram provados falsos, apenas que retornamos à posição de não saber se a intervenção proposta por ele teria o resultado descrito.

Uma discussão detalhada do caso pode ser lida aqui.

Um ano mais tarde, outra pesquisa, realizada pelo próprio acadêmico que descobriu a fraude e cercada de cuidados sobre seus métodos, confirmou o efeito de uma breve conversa sobre o assunto para reduzir preconceitos, com a diferença de que o visitante não necessariamente precisaria ser uma pessoa interessada, afetada pelo preconceito em questão. Este texto oferece mais detalhes.

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A revista norte-americana Science publicou no final do ano passado um artigo de grande interesse para qualquer pessoa envolvida com causas de impacto social e com grande polarização nas opiniões.

Pesquisadores da UCLA investigaram se uma única conversa de aproximadamente 20 minutos era capaz de mudar a opinião das pessoas a respeito de um assunto polêmico, como a legalização do casamento homossexual.

Eis o procedimento:

Voluntários, divididos entre gays e heterossexuais, visitaram 972 residentes de regiões da Califórnia que apoiaram a revogação do direito ao casamento homossexual, para falar sobre este assunto ou, para efeito de comparação, sobre reciclagem de lixo.

A amostra ficou dividida assim:

A - Pessoas visitadas por voluntários gays falando sobre casamento gay
B - Pessoas visitadas por voluntários hétero falando sobre casamento gay
C - Pessoas visitadas por voluntários gays falando sobre reciclagem
D - Pessoas visitadas por voluntários hétero falando sobre reciclagem

Três dias depois, os grupos A e B demonstraram grande aumento no apoio à legalização do casamento homossexual, diferente de C e D, onde não houve mudança significativa, como era de se esperar.

No entanto, algo muito interessante aconteceu com o passar do tempo: o apoio do grupo B recuou rapidamente, retornando à média, mas o apoio do grupo A não só se manteve onde estava como também serviu de influência para outras pessoas que vivem na mesma casa.



A linha vertical "Court Decisions" marca o momento em que os tribunais decidiram derrubar a decisão de revogar a legalidade do casamento homossexual. Neste período houve um salto no apoio da população, mas as proporções entre os grupos A, B, C e D se mantiveram como antes.

Ou seja: apesar de uma conversa com qualquer pessoa poder ter um impacto imediato na opinião de alguém, é só o contato direto, cara-a-cara com um indivíduo diretamente afetado pelo assunto em questão que tem efeitos positivos duradouros, e que ainda se propagam para as pessoas próximas

Uma outra consequência da conversa com o voluntário gay, e aí não importou o assunto, casamento ou reciclagem, foi o aumento da opinião positiva a respeito dos homossexuais em geral.

Todos os efeitos observados foram tão intensos e inequívocos que os pesquisadores repetiram o experimento para se certificarem, e obtiveram os mesmos resultados.

Mas tão importante quanto a identidade do voluntário é a maneira como ele abordou os entrevistados, o que ele fez e o que ele não fez durante a conversa. A instrução que receberam dos pesquisadores é que fossem educados e respeitosos, ouvissem atentamente o que a pessoa tinha a dizer, e não discutissem. Mais do que isso: eles perguntavam se a pessoa era casada, pediam que falassem sobre as suas experiências a respeito disso, e só depois de estabelecer um tom mais intimista na conversa é que revelavam ser gay ou lésbica, e que gostariam de poder ter os mesmos direitos que o entrevistado. Finalmente, perguntavam ao entrevistado qual era sua opinião sobre isso.

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O contato pessoal é um incentivo à moderação. Durante milhares de anos, foi assim que os grupos humanos se organizaram e resolveram suas disputas, se comunicando diretamente. É mais fácil pensar algo negativo do que dizer isso em voz alta, na frente do seu adversário. Com o advento da imprensa, e agora com a internet, torna-se cada vez mais fácil e mais comum assumir posições radicais sem nunca ter que lidar pessoalmente com alguém afetado por elas. Isso facilita e até incentiva a radicalização.

O que essa pesquisa indica, pelo menos para assuntos que afetam de maneira bastante específica a vida de certas pessoas, é que o caminho mais produtivo para angariar apoio é tratar aqueles com opiniões diversas como iguais, não como oponentes, e muito menos ridicularizá-los ou estigmatizá-los, que é uma atitude bastante frequente, pelo mesmo mecanismo citado acima: é tão mais fácil ignorar a humanidade do outro quando se está longe dele, ou quando se está dentro de um grupo homogêneo, com opiniões iguais à sua.

REFERÊNCIA: When contact changes minds: An experiment on transmission of support for gay equality.



5 Marcel R. Goto: Uma conversa de 20 minutos pode fazer a diferença no apoio ao casamento gay. CORREÇÃO: Um mês e meio após eu publicar este texto, foi descoberta fraude no estudo em questão, o que, dada a sua repercussão, rendeu um do...

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